segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Pensamento infantil - A narrativa da criança






Este é um assunto muito importante, não só para Educadores, mas também para a Família da criança, estimular momentos em que a criança possa contar suas experiências vividas no cotidiano.
A postura do adulto não deve ser de expectador da história, devemos ajudá-los a aprender se comunicar, porem é um momento delicado, que se não soubermos interagir da maneira correta, podemos “podar” sua imaginação.
Sempre me questionei como Educadora, se no momento em que as crianças estão narrando uma vivencia, e começam a colocar elementos fantasiosos na história, deveríamos ou não intervir? Esse artigo muito esclarecedor, explica como devemos encarar essas situações:

As histórias, sob a ótica das crianças

Os casos e as fabulações, em que relatos ganham elementos de ficção, são uma marca das narrativas infantis e fazem parte da evolução cognitiva.

Viagens supersônicas a planetas distantes. Lutas com gorilas. Bebês que sobem sozinhos no lustre. Cenas como essas só acontecem em filmes, livros e desenhos animados - ou na fala de uma criança pequena que conta sobre sua vida. Ficção e relato de experiências vividas são gêneros diferentes, mas, nos primeiros anos de vida, é comum que se combinem nas narrativas infantis, como apontou a linguista Maria Cecília Perroni no livro Desenvolvimento do Discurso Narrativo. Segundo ela, no entanto, esse recurso não deve ser entendido como um problema de falta de clareza entre o real e o imaginado. Ao contrário: é preciso encará-lo como um dos elementos mais importantes para o desenvolvimento cognitivo e afetivo dos pequenos. O que se testemunha nesse tipo de construção é justamente o nascimento do discurso narrativo - uma das principais estruturas de expressão de qualquer pessoa e uma essencial troca comunicativa.

Esse processo - que se estende até a idade adulta - começa antes mesmo de a criança conseguir falar. Nesse período, ela já é capaz de entender as histórias contadas pelos adultos e o contato com relatos cotidianos ou contos de fadas, por exemplo, faz com que, aos poucos, adquira um repertório de imagens, nomes e roteiros de ações que utilizará mais tarde. Também a compreensão dos usos e do funcionamento da linguagem tem início nessa fase, com o adulto como modelo da forma de se comunicar e como voz da cultura em que está inserida. Assim, quando conquista condições fisiológicas de falar e passa a descrever com palavras um encadeamento de ações que se desenrolam no tempo - uma possível definição de narrativa -, ela acessa todos esses diferentes repertórios acumulados desde os primeiros meses de vida.


Adquirir a fala, por sua vez, é um passo transformador em termos cognitivos, uma vez que é a linguagem que organiza o pensamento. "O pensar não se estrutura internamente, mas no momento da fala", explica Maria Virgínia Gastaldi, formadora de professores do Instituto Avisa Lá, de São Paulo. "A narrativa (primeira estrutura da oralidade com que a criança tem contato em seu cotidiano) é, portanto, o que modela e estimula a atividade mental." A oralidade é, dessa forma, um dos principais motores do desenvolvimento na primeira infância e aspecto-chave da creche e da pré-escola.


Ao construir narrativas, a criança brinca com a realidade e encontra um jeito próprio de lidar com ela.
A postura do professor ou da família na interlocução com os pequenos, por sua vez, faz toda a diferença. "O ideal é que ele seja um verdadeiro co-construtor das narrativas, incentivando a criança a avançar nos recursos que utiliza em suas construções", diz Maria Virgínia. "As limitações linguísticas nessa fase são importantes e o adulto deve não só escutar o que ela diz mas também reconhecer sua intenção comunicativa e ajudá-la a expressar-se melhor."


Assim, se na hora de recontar a história de um livro conhecido - sobre um personagem que tem medo de ir ao dentista, por exemplo -, a criança diz "o dentista lavou meu dente" (remetendo-se a uma experiência dela mesma, real ou imaginada), o professor pode perguntar se aquilo aconteceu com o personagem do livro também, como é o nome dele, o que ele sentiu quando estava no dentista, o que aconteceu depois etc.


Essa co-construção é o chamado "jogo de contar" - situação básica de aprendizagem quando o assunto é oralidade e que envolve uma relação de cumplicidade entre a criança e seu interlocutor.




Em rodas de conversa, é muito comum que os pequenos comecem contando sobre o passeio que fizeram ao zoológico com a família e terminem narrando como quase caíram na jaula do leão ou como o irmão se perdeu e não foi mais encontrado. Esses "causos" têm ligação com a presença do faz de conta no pensamento infantil e a maneira de apreender o mundo e elaborar os sentimentos, que é uma característica marcante nessa faixa etária. "A criança brinca com sua realidade, extravasando-a para experimentar outros papéis e situações", diz Gilka Girardello, professora do Centro de Educação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Segundo ela, ao fazer isso, os pequenos articulam imagens do repertório que conquistaram ao longo de sua vida para explorar futuros potenciais. A criação de papéis e situações de faz de conta nas brincadeiras ("Eu era herói, você, o monstro" e "Eu era a mãe, você, a filhinha") assume a forma de simbolização nas narrativas infantis ("Meu irmão mais velho começou a se afogar e meu pai pediu que eu o salvasse", dito por uma criança de 3 anos, por exemplo).


"Sabe, um dia o Alê se afogou e daí o meu pai ficou lá. Eu disse: "Pai, deixa que eu pulo na piscina. Eu quase que caí... Aí eu pulei lá e salvei o Alê. O Alê ainda era pequeno." Gabriel, 3 anos




"Quando eu fui lá na pedra, eu tava subindo. Eu tava sozinha e eu vi o peixe voando. Isso foi lá na praia. Daí caiu neve. Mas a gente pôs casaco e aí ficou quentinho. Apareceu uma cachorra que chama Pipoca, que mora em casa. Ela tava andando na areia. Eu pus uma roupinha nela porque ela tava com frio. Eu tava nadando sozinha. E eu fui lá no fundo sozinha. Eu tava com uma fita na cabeça, mas eu tava sem boia." Lívia, 4 anos



Para o psicanalista e pesquisador da infância Donald Winnicott (1896-1971), as simbolizações se enquadram no que ele chamou de espaço potencial. "Trata-se de uma área de experiência em que os pequenos podem brincar com a realidade, em que dão um sentido pessoal aos elementos do ambiente e os elaboram à sua maneira para com eles poder lidar", explica Ana Paula Stahlschmidt, doutora em Educação e estudiosa da obra do pesquisador. Esse espaço potencial, segundo Winnicott, deve ser garantido pelo adulto para que o pequeno dê liberdade à sua criação - não apenas artística, mas como uma forma autêntica de encarar a vida. Se, por um lado, fica claro que a criança precisa brincar com os elementos de seu repertório - sem ser reprimida por não estar contando "a verdade" sobre o passeio ao zoológico -, por outro é preciso cuidar para que ela tenha matéria-prima para fazê-lo: um repertório de histórias diversificado.


O contato com relatos de experiências nos grupos em que circula (na fala de adultos e também de outras crianças) e com textos literários (lidos e contados) é fundamental para ela se familiarizar com os aspectos estruturais da narrativa, como marcadores de tempo e espaço e a contextualização de situações.



Situações vividas, imaginadas ou presentes em histórias ouvidas se misturam nas narrativas infantis
"Também o elemento da dramatização é incorporado pelos pequenos no contato com narrativas", diz Lélia Erbolato Melo, linguista da Universidade de São Paulo (USP). "Eles vão percebendo e incorporando os ingredientes que tornam as histórias interessantes, como a ação, os conflitos e o inesperado, e trazem isso para aquelas que contam." Além disso, o acesso a textos tem um papel importante no amadurecimento afetivo dos pequenos, garantindo que ampliem seu universo de experiências para além do que podem observar no seu cotidiano. "Ao ouvir histórias, a criança cria hipóteses sobre como se sentiria se estivesse frente aos mesmos dilemas e situações do personagem", diz Gilka. "Para os menores, é natural que essa vivência, tão forte, seja incorporada às narrativas que constroem na forma de casos." Os fatos e a ficção são separados por uma fronteira flexível.




A distinção entre ficção e realidade ainda está em desenvolvimento nos anos da Educação Infantil - um aspecto que sempre deve ser considerado nas conversas com os pequenos. Isso se relaciona com uma das características mais vivas do pensamento da criança: o sincretismo, ou seja, a liberdade de associar elementos da realidade segundo critérios pessoais, pautados principalmente por afetividade, observação e imaginação. É comum, quando se lê uma história como Chapeuzinho Vermelho, que uma criança interrompa para dizer que "a avó também mora perto de uma floresta" ou que ela "viu um cachorro na casa do vizinho" (no momento em que o lobo surge no texto, por exemplo). Quando assume o papel de narrador, essa flexibilidade de fronteiras entre experiência pessoal e situação imaginada se mostra tanto nos relatos reais como nas histórias ficcionais. "O mais comum e saudável é que a criança misture realidade e ficção para mais tarde separá-las", diz Maria Virgínia. Segundo a especialista, o adulto não deve questionar se o que ela conta é verdade ou invenção, mas embarcar na aventura e pedir mais detalhes. "Em muitos casos, ela vai rir ou dizer que o adulto já sabe que aquilo não é verdade." Em geral, a inquietação do professor vem do medo que isso se fixe como um padrão de comportamento - em outras palavras, que a mentira se torne uma constante na vida futura. "Os jogos de contar e a experiência com os usos sociais de comunicação são suficientes para a criança se ater cada vez mais aos fatos 'vividos' em seus relatos", afirma Maria Virgínia. O único cuidado essencial ao professor é não tirar conclusões precipitadas sobre as narrativas. O aluno falar de uma briga violenta, por exemplo, não quer dizer que isso aconteça na casa dele. "Não é possível saber a quem as crianças se remetem com seus personagens", diz Ana Paula.



Fonte: http://revistaescola.abril.com.br/educacao-infantil/0-a-3-anos/tem-monstro-meio-historia-489258.shtml





Quer saber mais sobre a construção do Pensamento da criança e o sincretismo?

Leia o Artigo abaixo:



O pensamento infantil sobre os fenômenos naturais

Entenda de que forma os pequenos criam teorias e explicam os fenômenos naturais até se aproximarem dos conhecimentos científicos.

Este é o planeta e as estrelas. E estas são estrelas também. E o astronauta." Yolanda

"Tem uma Lua ajuntada (cheia) que parece uma bola e tem uma outra que é sem ajuntada." Yolanda

"Sem ajuntada é quando ela tá sumindo. Quando ela tá ajuntada é quando é meia-noite." Julia

"Aí, não é. Quando tá meia-noite, a gente tá dormindo. Então a Lua não tá ajuntada." Yolanda

Revirando a memória, todos nós recordamos de ambientes, passagens e sensações da infância. Mas você saberia dizer como costumava explicar a alternância entre o Sol e a Lua no céu? A criança tem uma maneira muito peculiar de entender o mundo e, à medida que cresce, se desenvolve, tem acesso a novas informações e experiências e esquece seu antigo modo de pensar.

O professor de Educação Infantil, como muitos outros adultos, presencia e vive essa evolução. Conhecer a maneira como os pequenos formulam as primeiras explicações para a dinâmica dos astros (veja o desenho ao lado) não é apenas reviver o frescor da visão sem as amarras dos primeiros anos de vida. Um educador que considera os processos por que passa a criança qualifica suas intervenções no contato diário com ela. Afinal, o que se quer é tornar cada vez mais sofisticada, coerente e ativa a forma de ela apreender a realidade.

Em rodas de conversa, é comum ouvir explicações curiosas sobre os fenômenos naturais, tais como: "O vento sopra o Sol para que ele não caia na Terra" e "A Lua segue o carro da gente pela estrada". Presente no cotidiano, a natureza está entre os primeiros aspectos sobre os quais os pequenos formulam teorias.

Um ponto importante para começar nessa aprendizagem é garantido já no primeiro ano de vida. O bebê adquire uma noção de abstração. Ele percebe que os elementos ao seu redor existem independentemente de os estar vendo - o conceito de permanência dos objetos.

Assim, ele passa a criar imagens mentais sobre as coisas - ele sabe que a mamadeira existe, por isso pode evocá-la mesmo quando não está em seu campo de visão. Com a aquisição da linguagem, a criança entra no território do simbólico: uma palavra, uma expressão corporal ou um desenho representam um objeto ou conceito e, com base na associação de alguns deles, cria-se uma ideia.

Com esses recursos, ela pensa sobre tudo o que vê, ouve e sente. Nesse contexto, entram em cena os famosos "por quês?". O fato, porém, é que os pequenos se põem muito mais questões do que expressam e as resolvem formulando teorias. Para isso, lançam mão de um repertório de informações e da observação dos fenômenos, relacionando-os de maneira muito particular. Uma característica desse processo é a de se colocarem como a figura central nas explicações - se eles estão dormindo e não podem ver o céu, a Lua não pode estar cheia (leia o diálogo acima). Esse princípio se liga à afetividade, que, segundo o francês Henri Wallon (1872-1962), é o que mais influencia a criança nas relações que estabelece entre as informações assimiladas. "É por isso que, quando ela pergunta 'por que fica de noite?', o adulto pode entender que ela está perguntando 'porque fica noite para mim?'", explica Heloysa Dantas, educadora estudiosa do pensamento de Wallon. "O adulto pode dar a explicação que achar conveniente, mas a que contentaria mais a criança em suas inquietações pessoais seria 'fica de noite para você poder dormir'."

Outras lógicas frequentes nas explicações infantis são o animismo e o artificialismo. Pela primeira, atribuem-se características e ações humanas aos mais diversos elementos da realidade ("O Sol vai dormir. Por isso, fica noite!"). De acordo com o segundo, entende-se que todos os fenômenos podem ser explicados por um processo de fabricação artesanal ("As montanhas se formam porque os homens colocam terra em cima"). Wallon define o pensamento infantil como sincrético, uma espécie de nuvem de elementos que vão se combinando para criar sentidos.

Este é o céu de noite. Aqui, a borboleta está dormindo, pintada de preto, porque tá escuro. Este é o céu de dia, com a borboleta vermelha porque tá claro.” Giovanna

"Ela não tem asa para voar." João


"Tudo o que a gente jogar vai cair no chão?" Monique


"Vai! Só passarinho que não." Giovanna


"E o que puxa as coisas para o chão?" Monique


"Ímã!" Giovanna


"Nesta parte da Terra está de noite porque os raios do Sol não tão batendo aqui. Eles tão batendo do outro lado do planeta, que vai girando ao redor do Sol. Quando anoitece, é o Sol que está escondido atrás das nuvens." Anita

Como se vê, a lógica científica não é o principal parâmetro da criança para esclarecer o funcionamento das coisas. "Ela relaciona o que lhe parece adequado, sem necessitar submeter a ideia a convenções preestabelecidas", afirma Heloysa. Sem se dar conta, os pequenos criam metáforas para explicar a realidade. "Daí a riqueza poética de sua forma de pensar. Entender o Sol e a Lua como namorados brigados que nunca ficam juntos segue o mesmo padrão de raciocínio apresentado por Camões, em Os Lusíadas, ao tratar uma pedra grande por Gigante Adamastor. É algo da natureza do pensamento infantil que apenas os artistas não abandonam em prol da lógica prática."

É preciso ainda levar em conta que a criança constrói formulações de acordo com suas possibilidades cognitivas. Os conhecimentos científicos - complexos e abstratos que requerem um raciocínio hipotético-dedutivo - ainda são inacessíveis aos pequenos. Mas é na Educação Infantil que eles começam um percurso de aprendizagem e desenvolvimento que os tornará capazes de operá-los melhor.

O bielo-russo Lev Vygotsky (1896-1934) diferenciou os dois tipos de conceito que convivem na compreensão da criança pequena sobre o mundo que a cerca: os científicos (assimilados na instrução formal) e os cotidianos (obtidos no convívio prático). O pensador desenvolve sua teoria com base na ideia de que os primeiros saberes da criança sobre o mundo vão se sofisticando ou perdendo espaço para outros, mais próximos dos conhecimentos científicos. "Primeiro, ela conhece o cachorro da casa dela. Em seguida, vai entendendo que aquele cachorro é um ser vivo, para depois assimilar que pertence à espécie dos canídeos e também é um mamífero", explica Teresa Cristina Rego, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP) e especialista nas obras de Vygotsky.

As formulações criadas pelos pequenos nos primeiros anos de vida também estão ligadas a situações e elementos proporcionados pelo meio em que vivem. Ao ver uma foto de uma nebulosa (corpo celeste gasoso e nevoento), uma menina de 4 anos define: "É uma nave alienígena" - algo que dificilmente seria dito por uma criança de uma comunidade indígena isolada. A linguagem, portanto, é apenas uma das condições para o pensamento abstrato, que ajudaria a moldar esse olhar da criança e a sua forma de construir formulações.

Se a cultura influencia a observação e a explicação de fenômenos, também não se pode retirar da criança o papel principal do desenvolvimento de seu próprio pensamento. "Ela não se contenta em repetir o que é dado culturalmente. É ativa e produz em cima disso", argumenta Monique Deheinzelin, assessora da Escola Comunitária de Campinas, a 100 quilômetros de São Paulo.

Nessa construção, no entanto, alguns cuidados precisam ser tomados. Embora a explicação pessoal para os fenômenos naturais tenha grande importância no desenvolvimento infantil, cabe à escola aproximar os pequenos dos conhecimentos científicos. E isso vai se dando aos poucos. A criança pode até saber que está de noite porque os raios do Sol não batem aqui, em uma explicação que faria acelerar o coração de qualquer docente da pré-escola.

Na mesma conversa, no entanto, ela pode dizer que anoitece quando o Sol está escondido atrás das nuvens (leia a frase acima). Como analisa Zilma de Moraes Oliveira, professora aposentada da Faculdade de Filosofia, Ciências Sociais e Letras da USP, em Ribeirão Preto, a 315 quilômetros de São Paulo, o docente não deve nem ignorar o raciocínio infantil nem impor a teoria adulta. "O educador deve criar um ambiente de escuta. É uma atitude de inclusão da criança em um ambiente de reflexão", diz. "Compreendendo a linha de pensamento dos pequenos, o docente localiza pontos para intervir", afirma.

Fonte:http://revistaescola.abril.com.br/crianca-e-adolescente/desenvolvimento-e-aprendizagem/pensamento-infantil-fenomenos-naturais-475516.shtml









sábado, 22 de agosto de 2009

Relato de Parto

Estes relatos de parto foram cedidos pelas participantes do Grupo de Apoio à Maternidade Ativa.

Relato da Carol:

Duas Lagartas:

Eu e o Rapha começamos a namorar em 97 e sempre quisemos ter filhos, ele perdeu o pai aos 9 anos e minha mãe sofreu um acidente cirúrgico – um erro da anestesista – quando eu tinha 12 anos. Ele foi criado pela mãe e eu pelo meu pai, talvez por isso tivéssemos essa vontade tão forte e uma certeza de que seríamos pais, e dos bons! Namoramos por 3 anos e pouco e depois brigamos. Curiosamente, depois que nos separamos passei a ter cólicas terríveis, algumas vezes cheguei a ir para o hospital, pois elas eram muito intensas. Minha ginecologista – a mesma desde os 12 anos - me pediu uma USG e foram detectados cistos ovarianos com consistência achocolatada (como eles dizem). Ela disse que existia a possibilidade de ser endometriose, mas que a certeza do diagnóstico só poderia ser dada depois de uma cirurgia. Optei por tentar um controle hormonal e ver como as coisas caminhariam. Tudo só piorava: as dores foram aumentando e os exames de USG só detectavam que os cistos cresciam... Eu tenho pânico de hospital, e principalmente de anestesia – obviamente – e pensei que se eu ignorasse o problema ele deixaria de existir. Continuei minha vida e me acostumei às dores... Quando menstruava tomava uns Buscopans e conseguia trabalhar e viver quase “normalmente”. Nesse meio-tempo meu pai foi diagnosticado com câncer de pulmão e voltei minhas atenções para ele, não me importava para minhas cólicas, dores ou problemas. Quando meu pai estava na fase terminal eu pensava o quanto queria que o Rapha estivesse ao meu lado, mas também não me achava no direito de pedir isso a ele, uma vez que não estávamos mais juntos... Depois que meu pai morreu, em novembro de 2002, agendei minha cirurgia: tinha decidido resolver tudo que havia ficado “em aberto”. Fui operada no início de dezembro de 2002 e minha endometriose (afinal era isso mesmo), foi diagnosticada como nível IV que é a pior de todas. Além dos cistos ovarianos haviam vários focos espalhados pela cavidade abdominal. Depois da cirurgia eu ainda tive de fazer um tratamento hormonal que incluía induzir uma menopausa precoce por 6 meses – duas injeções de Zoladex L.A. – e depois continuar evitando a menstruação tomando pílula anticoncepcional ininterruptamente por mais um ano, no mínimo.

A terceira lagarta:

Perto do Natal de 2002 eu e o Rapha voltamos a nos falar e a nos ver, ele foi comigo ao SUS buscar as injeções, passamos o ano-novo juntos e voltamos a namorar. O recomeço foi difícil, a menopausa induzida era horrível e eu sofria muito, sem contar que estava em depressão por ter perdido meu pai e me sentindo “sozinha no mundo”. O Rapha me salvou, me apoiando e me mostrando que estava do meu lado, que a gente ainda tinha muita coisa para fazer juntos, que tínhamos uma família para construir e uma vida inteira pela frente.Aos poucos fui retomando minha vida, voltei a estudar, repensei minhas escolhas profissionais e pessoais e tudo foi se ajeitando... Decidimos, então, que era hora de tentarmos ter um bebê.A endometriose é a maior causa de infertilidade feminina e eu morria de medo de não conseguir engravidar, minha médica me dizia que, no meu caso, a indicação era a de fazer uma fertilização in vitro, pois minhas chances de ser mãe naturalmente eram mínimas... Enquanto eu fazia uns exames eu teria que ter os ciclos menstruais completos para medir hormônios e outras coisas, mas não por muito tempo, 3 à 5 meses, dependendo de como estivesse o meu CA125 (um exame que ajuda a indicar a possibilidade de endometriose, que ela nunca havia me pedido antes, hein? ). Nesse meio tempo, eu poderia tentar engravidar. Fui fazendo meus exames e ao mesmo tempo, na maior ansiedade e medo de não conseguir engravidar e ter que fazer a FIV. Venho de uma família grande de mulheres parideiras, minha avó teve 9 filhos (8 mulheres e 1 homem) 8 de parto normal, quase todas as minhas tias têm filhos, pelo menos 3, vários partos normais, algumas cesáreas ... enfim, sempre soube que eu seria mãe e de repente, achei que não conseguiria ... estava em pânico! O Rapha, ao meu lado, sempre me colocando pra cima e me fazendo acreditar nesse sonho junto, ele dizia: “é claro que a gente vai ter todos os filhos que a gente imagina!”, e continuamos tentando...Paralelamente ao tratamento tradicional com essa ginecologista eu comecei a fazer acupuntura com um médico maravilhoso chamado Dr. Komino, ele sempre me dizia que eu não estava lá para tratar da doença, que isso era com os nossos médicos, lá eu tinha que tratar dos fluxos de energia do meu corpo, a coisa toda dos meridianos. Quando estava tentando engravidar voltei lá porque ele sempre me disse que a endometriose não me impediria de ser mãe e que quando eu quisesse engravidar era só voltar lá, afinal, “tinha agulha só pra isso”! Fui apenas uma vez, um pouco antes de saber que meu CA125 estava altíssimo e eu não poderia mais tentar. Parei de tomar a pílula em março de 2005 e em final de maio minha médica me diz: “você tem que bloquear seus ovários imediatamente, para ser mãe só fazendo uma FIV”. E eu pensando: “ok, trigêmeos ...”

Casulo:

Eu deveria esperar o primeiro dia da próxima menstruação para voltar a tomar a pílula e guardar meus óvulos para a FIV. Até que a menstruação não veio: totalmente psicológico, pensei. Mas ela não veio mesmo, e a cada dia que ela não vinha eu pensava: to grávida! Será? Depois de uma semana atrasada fiz o teste mais vagabundo da farmácia: positivo! “Rapha, to grávida!” “Mentira?” “...deu positivo...” “Vamos comprar o teste mais caro que tem!” De tarde fiz outro: positivo! Curiosamente era 28 de julho, data do nosso primeiro aniversário de namoro, 8 anos antes. Liguei pra médica: Dra, tô grávida! Ela: “impossível, como é que você sabe?“ Fiz dois testes de farmácia e nos dois deu positivo! Ela: “então você ganhou a mega-sena duas vezes, pois suas chances eram estas...”Fui fazendo meu pré-natal com ela, nos três primeiros meses tinha que usar umas cápsulas de progesterona, por conta de um pequeno sangramento que eu tive, fui indo... Sentia-me muito bem, mas toda vez que eu ia à médica ela me deixava meio pra baixo. Primeiro era aquela paranóia de segurar o embrião, depois ela achou que eu tinha engordado demais, que poderia ser diabete gestacional - mesmo com todos os exames indicando que eu estava bem.Desde o começo da gravidez comentava sobre o parto normal, sobre a possibilidade de parir de cócoras, sem anestesia... E ela sempre me dizendo: “você deveria dar-se por satisfeita por continuar grávida e ainda quer inventar moda?”. “A gente estuda anos para aprender a fazer um parto eficiente e você fica querendo voltar no tempo?”. “O ideal no seu caso era a gente fazer uma cesárea para aproveitar e ver se a endometriose está severa de novo...” Eu disse à ela que gostaria de "não misturar doença com saúde", que se eu tivesse que fazer a videolaparoscopia novamente, eu faria, mas gostaria de guardar o momento do parto, como um momento de alegria, de saúde, de vida... Até que comecei a ter umas dores horríveis no cóccix, a médica me disse que era normal, por causa do afrouxamento nas articulações e não havia nada que eu pudesse fazer. Procurei novamente o Dr. Komino, e ele me disse: “em grávida eu não gosto de colocar muitas agulhas, mas você deveria procurar a Violaine que é osteopata e obstetriz”.

Colorindo as asas:

Conheci a Violaine e minha vida mudou. Na primeira consulta ficamos mais de duas horas conversando e ela soube de toda a minha vida, coisa que a outra médica nunca quis saber. Quando falamos sobre o parto ela foi categórica: “se você continuar com essa médica ela vai roubar o seu parto... eu não poderei te acompanhar e provavelmente nem o seu marido. Por que você não vai conhecer o Dr. Jorge Kuhn? Acho que vocês vão gostar dele... conversem bastante e pensem com calma”.Fomos eu, o Rapha e o barrigão de quase 7 meses. Quando saímos do consultório do Dr. Jorge estávamos tão felizes e confiantes que já começamos a fazer os planos de como seria nosso parto, se tentaríamos em casa ou iríamos para o hospital... a outra médica simplesmente foi abandonada, afinal ela não entendia nada sobre parto, coitada. Nosso pré-natal continuou seguindo às mil maravilhas, decidimos que tentaríamos o parto natural hospitalar - o domiciliar ficou para o próximo! A data prevista para o meu parto era entre 1 e 2 de março...

1º. de março (era quarta-feira de cinzas) lá pelas 4h30 da madrugada levantei para ir ao banheiro e tinha perdido o tampão, de manhã liguei para a Violaine, ela: “está sentindo mais alguma coisa?” Eu: nada! De noite fui nadar pensando: a partir de hoje o Tom já está fazendo hora extra, vou nadar bem forte para ver se acontece alguma coisa. Dito e feito: quando saí da piscina senti um monte de água descendo: será que foi a bolsa? Como nada mais aconteceu fui dormir, no dia seguinte ás 8h liguei para a Violaine contando o que aconteceu. Ela perguntou: “saiu água e parou, ou ficou saindo de tempo em tempo?” Saiu um tanto e parou, eu disse. - “está sentindo as contrações?”, ela perguntou. "Como é que eu vou saber?" E ela: "você vai saber!" Eu disse que não. Combinamos que ela vinha me ver de tarde. 11h da manhã a bolsa rompeu de verdade, águas saíam de tanto em tanto. Falei com o Dr. Jorge, que estava fazendo um outro parto e ele me pediu para que dissesse à Violaine que telefonasse para ele assim que ela me visse. As águas continuavam a descer de tempos em tempos... 16h chega a Violaine, faz o toque e me diz que eu só tenho 0,5cm de dilatação, que vai demorar... Eu apenas com uma “coliquinha” pensando: se for assim vai ser fácil. Foi ela colocar o pé na porta, às 17h, tive a primeira contração, doeu muito, falei com o Rapha que conseguiu pegá-la ainda na minha porta, ela nos disse para marcarmos o tempo entre as contrações e que iríamos nos falando... Como era meu primeiro parto, provavelmente demoraria muitas horas e o melhor era esperar em casa. Neste momento soubemos que o Dr. Jorge estava indo para Ilha Bela fazer um outro parto e que deixaria a Dra. Andrea Campos em stand by para o caso do meu parto evoluir rapidamente. Comecei a ter contrações irregulares, a cada 12, 13, 11 minutos. Logo depois de 7 em 7 minutos, a esta altura eu estava subindo pelas paredes de tanta dor. O Rapha marcando o tempo entre as contrações e eu lá, surtando, dizia: "quero uma anestesia agora! Rapha liga pra todo mundo e manda preparar a agulha que eu vou tomar uma anestesia agora! Parto natural é o ca*&¨%$¨%***.!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!" Ele ligou mesmo, mas a gente sabia que não era assim... mesmo que você queira a anestesia ela não pode ser dada a qualquer momento porque o trabalho de parto pode estacionar, ter seu ritmo natural totalmente alterado e acabar numa cesárea desnecessária. E eu, de olhos fechados o tempo todo, passando mal, não encontrava posição, tomei ducha, sentei na privada, andei, tomei outra ducha, sentei de novo e finalmente deitei do lado esquerdo, na minha cama...

Rompendo o casulo:

Lá pelas 20h chega Violaine, eu já tinha virado um bicho e estava em outro planeta, numa viagem alucinante rumo ao desconhecido... A primeira coisa que eu disse foi: “não vou agüentar, preciso de uma anestesia”, e ela: “calma Carol, vai dar tudo certo”. “Eu não tô agüentando...” Aí ela me ensinou a deixar a contração vir, me explicou que era como uma onda que subia até o final do útero e depois descia e que eu tinha que deixar ela vir e não travar a barriga como eu estava fazendo. Eu fui acalmando, leva fez o toque – entre 3 e 4cm... E ela sabia que eu queria ir pro hospital e me disse: “se você quiser ir, vamos agora...” E eu queria, mas não conseguia me levantar... Perguntou pro Rapha sobre os médicos e tal e queria saber se a gente não ia levar o neonatologista, dissemos que não e ela sugeriu que conversássemos com o Cacá, os procedimentos do hospital são realmentes punks para os bebês e não fazia sentido ter um parto super humanizado e depois deixar que meu filho passe por procedimento desumanos... Rapha perguntava pra mim, fiz que sim com a cabeça... ele ligou, conversaram e resolveram que o Cacá também ira ... Dr. Jorge já não estava e não conhecíamos ninguém que estava indo fazer o nosso parto e como a Violaine se formou na França seu diploma não vale nos hospitais daqui e eles não dão autonomia nenhuma para ela... Fomos para o hospital, eu com muita dor no banco de trás com a Violaine e o Rapha, a meio por hora, me disse depois: “parecia eu tava dirigindo um carro de pedra!”. Chegamos ao hospital e é aquela tortura: o Rapha na recepção e eu e a Violaine naquela triagem maldita tendo que deitar de barriga para cima para a enfermeira “ver se tem dilatação ...” a gente sabia que era TP mesmo! Nesse momento a outra enfermeira diz: ela já está no expulsivo, dilatação total... me enfiaram numa maca e me levaram pro centro-obstétrico. A Violaine e o Rapha teriam que colocar aquela roupinha e iriam por outro caminho...Assim que cheguei ao centro obstétrico (22h15) veio o anestesista: boa noite, eu sou o seiláquem, anestesista, e vamos aplicar uma anestesia na senh... Eu: “o quê? Eu não vou tomar anestesia nenhuma... enquanto não chegar o meu médico, você não encosta a mão em mim...” ele: mas é o procedimento padrão. E eu pensava: se eu agüentei até agora e ele já vai nascer, pra quê que eu vou perder a melhor parte?! E a enfermeira gente-fina explicou que eu era paciente do Dr. Jorge Kuhn, do parto natural... o anestesista saiu se sentindo desprezado... Chegam Rapha e Violaine e na seqüência Dra. Andrea, Dr. Paulo (assistente) e Cacá. Eles me examinaram, estava tudo ótimo comigo e com o Tom! Pressão 12 por 8, batimentos regulares “uma atleta do parto” segundo o Cacá. Descolamos um banquinho de parto, um sonzinho, as luzes foram apagadas, só ficou uma indireta e tudo ficou calmo e tranqüilo.

O vôo da borboleta:

Eu já tinha me acalmado desde o momento em que a Violaine voltou, ter uma doula, que sabe o que está fazendo e sabe conduzir a situação, faz toda a diferença. Pude me concentrar no me corpo, no que eu estava sentindo e no nascimento do meu filho. A gente precisa ser amparada e não tratada como uma bomba, prestes a explodir. Será que os médicos e os hospitais não aprendem isso nunca??? Enfim, minha equipe sabia disso e mesmo sem nunca ter visto a cara de ninguém me senti completamente à vontade, Dra Andrea é muito doce e carinhosa e só me dizia que estava tudo bem, que eu estava ótima. Como a equipe chegou com notícia de dilatação total, fui direto para a banqueta de parto fazer força ... passado o primeiro momento de correria, Dra Andrea me perguntou se eu estava com vontade de fazer aquela força e eu disse que não, ela me pediu para fazer o toque e constatou que eu não estava com dilatação total coisa nenhuma, me disse que estava com uns 9cm e que o colo estava ligeiramente grosso, me disse que eu poderia fazer mais uma força na próxima contração que eu chegaria a 10cm e com o colo fino. Fiz a força e beleza, dilatação total! Neste momento, resolvi mudar de posição pois aquela banqueta estava acabando com as minhas costas, elas me sugeriram algumas, mas eu queria ficar deitada de lado, como estava na minha casa. Naquela maca do centro-obstétrico eu só cabia de lado mesmo, ela é minúscula e todo mundo sabe o tamanho da bunda de uma grávida, prestes a parir!A natureza é mesmo sábia e depois dos 10cm atingidos parece que o processo todo dá uma parada para possamos recuperar as forças, posição confortável conquistada, dilatação total atingida e as contrações recomeçaram. Eu estava numa viagem alucinante, me sentindo parte das coisas de Deus, vivendo a experiência mais profunda da minha vida e completamente entregue àquele processo, deixando que o poder natural do Feminino agisse sobre mim, me sentindo meio cavalo daquela energia maior. Começo a sentir os puxos e a vontade de fazer força, comecei fazendo uma força a cada contração e percebo que quanto mais força eu faço, menos dor eu sinto! Fazendo força a cada contração fui sentindo meu filho descer, meu corpo e minha alma se abrindo e aquela vida pedindo passagem, chegando cada vez mais perto do mundo. Tomzinho, guerreiro que sempre foi, permaneceu muito bem durante todo o trabalho de parto, até mesmo quando ficava indo e voltando no canal de parto. Pois isso estava acontecendo... Quando eu fazia força o Tom descia, quando eu parava de fazer força ele voltava pelo canal de parto, me disseram que eu deveria fazer uma força maior do que eu estava fazendo, para que a cabeça dele saísse e não voltasse mais pelo canal de parto. Veio uma contração e eu fiz muita força, até sentir a cabeça do meu filho saindo totalmente, mais uma contração e o corpinho escorregou para fora. Pegaram o Tom e colocaram em cima de mim, o cordão umbilical era muito curto (por isso ia e vinha pelo canal de parto) e ele não chegava até o peito, parava no umbigo. Ele começou a chorar e respirar assim que saiu da barriga, o Rapha cortou seu cordão umbilical e finalmente tinha meu bebê nos meus braços. Jamais vou me esquecer do cheiro dele, daquela carinha de recém-nascido lindo, daquela cabeça de egípcio e seu choro forte, que foi silenciando conforme eu e o Rapha conversávamos com ele. Ficamos nos conhecendo um pouco, eu quase não acreditava que aquele corpinho tinha crescido dentro de mim! Olhando seus olhos abertos e atentos, seu rostinho lindo e sua pele de manteiga. O Cacá pegou ele para pesar e medir, seu APGAR foi 9/10 ele pesava 3705g e media 51,5 cm, nasceu às 23h54 do dia 2 de março de 2006, na maternidade São Luiz, em São Paulo.

Pousando:

Neste momento eu já tinha retornado da minha viagem à partolândia, já tinha aberto os olhos e visto a cara das pessoas, agradecí a todos pelo trabalho.

Minha placenta já tinha se descolado e mais uma contração veio para que ela fosse “parida”, tive uma rotura no períneo e Dra Andrea me deu uma anestesia local para fazer a sutura. Tomzinho não parava de sugar as mãos, Cacá deu um banho de balde nele, mas ele só acalmou mesmo quando veio para o peito, mamou, mamou e sossegou. Era mais de 1h da manhã quando levaram o Tom para aquela maldida observação, Rapha foi fazer a minha ficha de entrada na maternidade e eu fiquei aguardando um quarto, cheguei no quarto lá pela 1h30 e quando encontrei o Rapha pedi para ele não desgrudar do Tom um minuto sequer. Eu estava me sentindo ótima, completamente adrenalizada, morrendo de fome e louca para ter meu bebê nos braços novamente. Minha sogra e meus cunhados chegaram e ao abrirem a porta escutei o choro do Tom, no berçário da minha ala, mas ainda tínhamos que esperar dar ao menos duas de observação, para tê-lo no quarto conosco. Três e pouco da manhã, Tomzinho finalmente veio para o nosso quarto, para ficar junto da gente e dormir o sono dos justos, ao nosso lado, desde aquele dia até hoje, 3 anos depois, quando eu finalmente consegui terminar este relato de parto, planejando outro filho, outra gravidez e outro parto!

Hoje, sei que senti muita dor, mas não consigo me lembrar dela com uma memória negativa, minha memória de parto é muito linda, quando me senti mais próxima de Deus, e da natureza feminina. Senti um prazer indescritível em poder parir meu filho de forma natural e me permitir viver o processo todo, com as minhas próprias drogas. Prazer físico sim, prazer emocional e prazer espiritual! Sorte das mulheres que conseguem passar por esta experiência tão bela e transformadora e lembrar dela com tanta alegria e emoção quanto eu me lembro, sortudos são os bebês que tem a oportunidade de nascer por vias naturais e serem respeitados desde antes de seu nascimento.

Ao príncipe:

Quero agradecer ao Tom, por ter nos escolhido como pais, por ter me transformado no que sou hoje, por me mostrar tantas cores e tantas nuances. Por ser o agente da maior transformação que já viví, por me fazer reacreditar em Deus, nas pessoas e num mundo melhor. Por me dar força e coragem para lutar, crescer, aprender e desaprender todos os dias.
Ao Rapha por ser este marido maravilhoso, este amante delicioso e este amigo tão incrível, por estar ao meu lado, por acreditar sempre na gente e por me apoiar nas escolhas e caminhos que busco trilhar. Sem você nenhum de nós teria conseguido viver um parto tão especial, obrigada por me fazer mãe de um cara tão bacana, por construir comigo uma familinha tão feliz e por ter me escolhido para ser a sua mulher.
Como disse a rosa do Pequeno Príncipe: “É preciso que eu suporte duas ou três lagartas se quiser conhecer as borboletas”.

Relato de Parto da Paula Lisboa

A chegada de Teresa

Parto pra mim sempre foi parto, não cirurgia. Minha mãe teve quatro partos, cada um mais rápido que o outro - o último, aliás, no carro a caminho da maternidade. Quando engravidei não tinha dúvida que teria parto normal, confiante que isso dependia mais de mim do que do médico. Durante todo o pré natal insisti com minha médica que eu teria normal e por muita sorte - hoje eu sei que foi sorte - consegui um "normal hospitalar pacote completo".Durante a gravidez tive contato com mulheres que teriam parto em casa e sentia uma tremenda inveja da chance que supostamente elas tinham e eu não, mas sequer me mobilizei para tentar essa possibilidade. Tive contato até com pessoas da ONG Amigas do Parto que alertaram para o risco de a médica me engabelar no final, mas não botei fé e continuei confiante que aquela médica do convênio daria conta do meu parto sim.Enfim, eu tinha uma segurança de que na "hora P" meu corpo entraria em ação e tudo daria certo. Graças aos deuses não cheguei a uma cesárea, mas o parto não foi nada daquilo que eu sonhava...

O trabalho de Parto

A primeira contração foi sentida às 2h30 da manhã, eu vendo TV e treinando tricô que tinha acabado de aprender - e nunca mais voltaria a fazer. Logo que senti a onda tomando conta do meu corpo, tive certeza que a hora havia chegado, mas achei que fosse durar no mínimo 8 ou 10 horas, como sempre dizem das primigestas. Chamei o Filipe, que dormia no sofá, dizendo que fosse dormir na cama, mas não o avisei de nada, preferi deixá-lo descansar.Fui para o banheiro, sentei na privada e veio outra, bem forte. Olhei no relógio: 10 minutos de intervalo com a primeira. Na calcinha, sangue. Fui pegar o livro "O que esperar quando se está esperando" para saber o que era aquilo, mas não encontrei nada claro, dizendo que era sinal de dilatação avançada (hoje eu sei...).Deitei para descansar um pouco, achando que só de manhãzinha eu iria para a maternidade, uma vez que meu plano era chegar já com trabalho de parto avançado. Fecho os olhos e acordo em seguida com outra contração, intervalo de 10 minutos. Achei melhor me arrumar, tomar um banho para ir logo.Ainda sem acordar o Filipe fui pro chuveiro e lá as contrações ficaram mais próximas, mas eu já nem contava. Saí e acordei o Fi, que levantou num pulo para marcar o tempo, ao que eu disse "Não precisa nem marcar, já está bem avançado, toma um banho rápido pra gente ir!".Aumentava a intensidade mas era suportável a dor, eu só precisava me concentrar e apoiar meu corpo na parede meio curvada para a frente, rebolando um pouco. Fui arrumar as coisas e às 4h45 liguei pra minha mãe, como havíamos combinado que faria. Pela minha voz ela percebeu que a coisa estava avançada - a voz meio soprada, que só sai com muita concentração. Sentia meu corpo tremer e achei que fosse fraqueza de fome; tentei tomar um missô, mas deixei a xícara pela metade...

A Caminho da Maternidade

Saímos de casa por volta das 5h20, cerca de três horas depois da primeira contração. Achei tão esquisito sair na rua naquele estado! Parecia sair na rua no meio de uma transa, sei lá, algo tão íntimo acontecendo comigo e eu descendo elevador, saindo na rua para pegar o carro, que coisa estranha! Por sorte não encontrei ninguém.Tive que me acomodar no carro apoiada na cadeirinha já instalada no banco de trás e com o quadril para cima, pois era insuportável sentar. Sentia muito calor e pedia pro Fi abrir a janela, apesar do frio matinal que fazia. No trajeto passei o momento de maior dor e acho que se fosse pra pedir anestesia teria sido nesse momento, que eu acredito que tenha sido a fase de transição.Gritava pro Fi: "Corre devagaaaaar!!!!" e comecei a xingar horrores: "Aaaaai car*, p*q*p*, aaaahhh!!!".

A Chegada no Hotel-Maternidade (blergh!)

No estacionamento me ofereceram cadeira de rodas e eu neguei. Fui andando, pegamos o elevador (outro momento muito esquisito, parece que não encaixava a sensação interna e o cenário externo), eu já naquele estado de olhos mais fechados que abertos, querendo entrar na partolândia, mas presa pela realidade que tinha que enfrentar.Lembro de cada detalhe...Saímos do elevador e um segurança meio que barrou nosso caminho, pedindo nossos documentos. O Fi, carregado de malas, foi encostar num balcão para procurar os tais. Eu perguntei: "Os meus também?" e o segurança respondeu que eu me encaminhasse a um dos guichês.Pronto, Filipe foi raptado pela burrocracia e eu fiquei perdida, com trabalho de parto já avançado. Obediente, fui aos guichês, que eram só dois àquela hora da matina (mais ou menos 5h50). Ambos estavam ocupados por dois casais sentadinhos bonitinhos carregando suas malinhas lindas e perfeitas, dando entrada na papelada para a internação. Rrrrrrrrrr, que raiva me deu!!! Nem uma alma caridosa me percebeu ali, uma mulher em trabalho de parto dentro de uma maternidade, algo que deveria ser banal e corriqueiro, parecia tão estranho e fora de contexto!Eis que veio mais uma contração - enquanto eu aguardava um guichê ser liberado -, tentei apoiar em algum lugar mas não encontrei alívio, fui bravamente andando até o sofá, onde adotei a posição de quatro. Imaginem a cena: uma mulher de quatro no sofá do belo hall, gemendo em contrações (não faço a menor idéia do volume de som que eu fazia). O mesmo segurança que havia me encaminhado para o guichê, veio rapidamente botar ordem no terreiro: "Senhora! A senhora precisa se encaminhar para a sala de espera!" e tentou me oferecer ajuda para levantar. Meti a mão espalmada para cima e disse: "Espera que já vai passar!". E assim que passou, mais uma vez obediente perguntei: "Pra onde eu tenho que ir?".Fui à sala indicada, onde algumas pessoas assitiam TV ou liam revistas velhas, não faço idéia porque estavam ali. Eu tava perdida, não sabia bem o que fazer. Até que veio outra contração e novamente fiquei de quatro, numa poltrona que estava vazia porque era bem embaixo da TV. Uau, algo aconteceu naquela sala parada e monótona, todo mundo imediatamente se levantou como se acordados no susto e vieram me oferecer ajuda. Recusei, claro, novamente expliquei que era só esperar passar - esse era meu pensamento, é só aguentar que passa, louco perceber que até esse momento eu não vislumbrava meu bebê chegando, eu só me concentrava em suportar a contração, não pensava no parto que estaria para acontecer.Logo depois chegou uma enfermeira chamando pelo meu nome, com aquela voz meio de saco cheio. Desabafei: "Ufa, finalmente!". Quando ela me viu em trabalho de parto disse que eu precisava de uma cadeira de rodas, expliquei que eu não conseguia sentar, achando que pudesse ser compreendida e respeitada. Doce ilusão, ela fez que não ouviu e empurrou meus ombros para baixo, me forçando a sentar. Fiquei com o quadril elevado para cima, me segurando com as mãos. Ela só atravessou o corredor e entramos numa salinha em frente, pra que cadeira de rodas??Nessa sala tinha um monte de enfermeiras conversando e umas três camas tipo maca, lembro que me deu um alívio achando que agora seria amparada... Disse pra elas, quando tirei a calcinha "Ih, tá sangrando", mas ninguém deu muita bola. Quando me examinaram (não lembro de ser ruim) e deram o veredito "Ela está com 9 centímetros de dilatação!", lembro que pela primeira vez desde a entrada no carro eu abri os olhos pra valer. Sentei na cama no susto: "Nove??!! Chama minha médica!", nessa hora temi ser atendida por plantonista - mal sabia que talvez nem fizesse muita diferença...Ouvi as enfermeiras falando com a médica, e a partir daí eu já não me pertencia mais, não podia escolher como me locomover, em que posição ficar, onde ir, nada, agora fazia parte dos procedimentos padrão do hospital. Por sorte eu tinha me depilado, elas avaliaram que não era necessário fazer a raspagem dos pelos. Me transportaram para uma maca e me levaram para uma sala, onde a "cama" era dura, fria e super estreira, mas eu não tinha a menor cabeça para questionar onde estava. Eu continuava me concentrando nas ondas que vinham e iam, e me afligia a vontade quase incontrolável de fazer xixi, além da demora pro Fi chegar e ficar comigo. Pra solucionar a vontade de fazer xixi me trouxeram uma comadre, mas eu não consegui fazer xixi deitada - e não tinha autorização para sair dessa posição muito menos sair da cama dura e fria! Sobre o Fi elas se limitavam a responder "Ele já vem" e nada mais.Lembro de ouvir conversas entre elas e me incomodar demais com a quantidade de gente em volta e o descaso de todas com o meu momento. A postura delas não era nem um pouco diferente do que ao acompanhar um exame. Lembro de ouví-las dizer: "Tem certeza que ela está com 9? Mas quem examinou? Às vezes dá diferença de dedos..."Me sentia tão sozinha que o que me consolava era a vivência da dor, me entregava a cada contração inteiramente, mergulhava de cabeça naquela sensação, ignorando ao máximo tudo que estava à minha volta. A certa altura comecei a sentir uma vontade muito grande de apertar alguma coisa com as mãos para passar pela contração, mas não acho que fosse ainda a vontade de fazer força - essa eu não cheguei a sentir...

A Chegada da Médica

A médica chegou, me cumprimentou e disse: "O que ela está fazendo no centro cirúrgico? Ela quer ter parto normal?". Ai, ai, ai, não acredito!!! Por isso a cama era tão estreita e fria, eu não estava na tal "suíte para parto normal" que eles tanto progagandeiam na hora da visita à maternidade! Depois de tudo o que eu tinha passado até então, lembro que foi nessa hora que eu me senti mesmo uma ET, uma esquisitona que chegou "querendo" ter parto normal.
Enfim, novamente fui carregada para a maca e transferida para outra cama, realmente bem melhor - pelo menos isso! Sentia na médica um ar de urgência, uma afobação, uma certa correria. Novamente achei que agora sim estaria amparada, mas novamente não encontrei o amparo desejado. Perguntava pelo Filipe insistentemente, e ouvia sempre a mesma resposta "Já já ele pode entrar."Foi então que eu ouvi a pérola, a grande fala de uma médica até que bem intencionada, mas que aprendeu a ver o parto como um evento essencialmente médico, do qual a mulher é apenas mais uma peça entre todos os instrumentos cirúrgicos dos quais ela dispõe. Imaginem a fala em tom tranquilizador: "Paula, agora está tudo bem, espera só mais um pouquinho que a anestesista já está chegando e a gente termina o parto, ta bom?". Uau!!! Então quer dizer que ela é que vai terminar o serviço que meu corpo começou tão perfeitamente! Um ato fisiológico deve ser estacionado do meio para permitir que a equipe médica interfira e finalize... Em nenhum momento ela me perguntou se eu queria a anestesia, e se perguntasse eu muito provavelmente diria que não era necessário, uma vez que o momento de maior dor já tinha passado. Se não me engano eu ainda perguntei se ia dar mesmo pra ser normal e ela disse "Acho que sim.".Enfim, a anestesista chegou e por ironia foi a pessoa mais carinhosa que esteve comigo... O jeito dela, o toque, a voz, aceitou numa boa esperar a contração passar para eu aguentar ficar na posição. Explicou que daria a raqui porque o efeito era mais rápido. E que efeito!!! Imediatamente relaxei, tanto que por mim eu parava tudo para tirar um belo cochilo! Não sentia mais absolutamente nada!Então a médica estourou a bolsa, que ainda estava intacta, e fez um terrorismo básico vindo me mostrar que já tinha um pouco de mecônio no líquido. Recordando agora, lembro de ter sentido um certo medo nela, uma certa apreensão pelo transcorrer das coisas, como se ela não estivesse muito bem preparada para acompanhar um parto normal, mas não sei se é um pouco de imaginação minha.
Finalmente meu marido pôde entrar, que delícia tê-lo comigo!!! A médica auxiliar tentou me orientar a fazer força, mas eu não sentia nada, e sinceramente nem sei se já estava mesmo na hora de fazer força, porque antes da anestesia eu não me lembro de sentir os puxos. Eu disse que não conseguia e ela insistiu, dizendo que a força estava na minha cabeça. Me sentia uma incompetente por não conseguir... Sem esperar mais e sem que eu desconfiasse, a médica pegou o fórceps, fez a episio e a Teresa nasceu, sem que eu sentisse nada de nada. Nasceu às 6h45, cerca de quatro horas após o início das contrações.
O Filipe ficou feliz, viu ela nascendo, disse que assim que a médica fez o corte e colocou o fórceps, ela praticamente escorregou pra fora. Mas eu não sentia nada, não senti a emoção que esperava sentir. Fui ficar feliz mesmo quando a colocaram no meu peito para mamar; uma enfermeira veio me ensinar, ela era meio brava, mas fez com que a Tete pegasse o peito e sugasse, logo nos primeiros minutos de vida.
Lembro bem do seu rostinho, da carinha de choro que continua a mesma. Mas era tão esquisito minha filha ter nascido e eu ficar ali deitada, com as pernas abertas enquanto as médicas terminavam o serviço... Pelo menos fiquei uns vinte minutos abraçada com minha bebezinha linda, antes que ela fosse levada ao berçário e começasse a coceira e tremedeira de frio.Foram duas horas que fiquei ali deitada, totalmente desperta e agitada, mas não podia levantar enquanto não passasse a anestesia. Meu corpo se tremia inteiro de um frio horroroso que nem três cobertores aqueceram, e minha barriga coçava horrores. Eu lá sozinha, fiquei passando na minha cabeça todos os momentos que tinha vivido, desde a primeira contração às duas e meia da manhã. Minha mãe conseguiu convencer as enfermeiras a deixarem que ela entrasse um pouquinho, e isso foi muito bom. Ela conversou comigo, contei um pouco como tinha sido tudo, foi muito bom ter minha mãe perto de mim nesse momento.Enfim, o parto não foi o que eu sonhava, mas teve seus pontos positivos perto de tantas histórias que vemos por aí. Fiquei orgulhosa e satisfeita por ter tido um parto normal, mas decepcionada pelo fórceps e por não ter conseguido fazer a força necessária. Sentia um fracasso meu, no fundo sentia até vergonha desse desfecho, como se a responsável por ele tivesse sido eu... Tanto que por um bom tempo eu ocultava a informação do fórceps quando me perguntavam sobre o parto, pois para mim soava como uma derrota minha. Hoje sei que isso é reflexo do despreparo da médica, ou melhor, de um preparo equivocado. Uma história que foi se completar três anos mais tarde...

E lá vem o João:

As últimas semanas......foram cheias de sensações; sentia dia-a-dia meu corpo se preparando para o parto, me sentia dolorida, muito mais do que na primeira gravidez. Ouvia um barulhinho que parecia um pequeno estalo, não sei o que é exatamente, mas sei que na gravidez da Tete eu ouvi poucas vezes bem no finzinho, e dessa vez ouvi váááárias vezes. Era só eu estar relaxada que ele começava a se mexer e de repente vinha o "tlic" lá dentro! Incrível era o momento de pôr a Tete pra dormir: assim que tudo silenciava e eu ficava sentada na poltrona ao lado de sua cama, esperando que ela pegasse no sono, era então que o pequeno João começava a farra dentro da barriga! Era tanta mexeção que parece até que esse horário do dia já era conhecido e aguardado por ele!Eu sentia tanto o meu corpo se preparando para o parto que depois das 38 semanas toda noite eu achava que podia ser... Quando completei as 39 semanas cheguei a ficar receosa de sair de casa, ir muito longe, ficava com medo de entrar em trabalho de parto longe de casa. Escrevi um email pra maravilhosa lista das maternas e recebi todo tipo de incentivo, principalmente atentando ao fato de que a gestação pode durar até 42 semanas e que o trabalho de parto não começa assim de uma hora para a outra, além do que é muito gostoso curtir o barrigão nesse finalzinho, deixando lembranças gostosas desse momento especial.Com todo esse incentivo, dia 5 de julho mudei meu pensamento e comecei a achar que ele não nasceria antes do dia 10, ganhando assim mais alguns dias para curtir o barrigão sem medo. Fomos até a quadra da Gaviões comer feijoada e comemorar o aniversário do Fi, depois fui com Tete e dona Flavia costurar uma colcha de retalhos na Casa Materna. À noite ainda recebemos alguns amigos para cantar parabéns pro Fi, e esses de fato foram momentos que ficaram marcados em minha lembrança como as últimas vivências da gravidez do João.

No dia 08 de julho, 3a feira, eu queria muito ir com a Teresa numa sessão do CineMaterna, mas não consegui... Passei todo esse dia com uma dor que fisgava minha coxa direita, sentindo às vezes na parte interna, na virilha, e outras vezes no bumbum. Contrações indolores de braxton já eram velhas conhecidas minhas e não me impressionavam mais. Não cheguei a elaborar que o parto estava chegando, mas nesse dia estive bem cansada e não consegui fazer muita coisa, fiquei em casa o dia todo.Uma das coisas que eu senti bastante nesse finzinho da gravidez era uma dor na sínfese púbica, um indicativo de que o bebê estava encaixando e meu púbis se abrindo. Por conta disso comecei a fazer bastante abertura pélvica tipo "borboleta". Então à noite eu dormia de lado, com um travesseiro embaixo da barriga, outro no meio das pernas e de quando em quando eu abria as pernas para aliviar a dor na sínfese. E foi assim que o trabalho de parto começou...

39 semanas e 5 diasFeriado do dia 09 de julho, mesmo assim o Fi foi trabalhar. Por volta das 5h30, como de costume, ele me deu um beijinho de tchau e perguntou como eu estava. Respondi que tudo bem e voltei a pegar no sono. Então tive um sonho:Sonhei com a Alexandra e seu lindo filhote Felipe, que eu tinha conhecido no encontro da colcha de retalhos no sábado. Ela chegava na minha casa com ele no colo e eu os recebia do lado de fora. A casa era mais uma cabana, com muito verde, muita planta em volta, num lugar natural e protegido. Ela perguntava se poderia ficar em casa, ou dar de comer para o Felipe ali, alguma coisa desse tipo. E eu respondia que hoje não ia dar, que eu já tinha pedido pra Mirella também não vir hoje. Então aparecia bem grande o rosto da Ana Cris, que cobria toda a "tela" do sonho dizenho "É melhor assim, menos interferência pra você e menos interferência para o bebê!".Terminei de ouvir o conselho da Ana Cris já acordando. Acordei e abri as pernas em borboleta, para aliviar a dor e.... POC! tccchhhh, um liquido quentinho começou a escorrer levemente entre minhas pernas.Levantei rapidamente e fui até o banheiro, sem deixar que o liquido chegasse a molhar minha cama. Sentei na privada e comecei a viajar, pensando "Nossa, que legal, será que vai ser hoje que o João vai nascer? Que doido...". Por pouco não me deixei levar pela divagação, sorte que consegui me despertar, já começando a sentir leves coliquinhas "Paula, sua doida, se liga, você precisa agilizar, tem que avisar as pessoas, você está sozinha!". Acontece que junto com as leves cólicas veio também uma verdadeira lavagem intestinal ao natural, um piriri tremendo que não me deixava levantar da privada para ir telefonar! Quando percebi que as cólicas estavam mesmo acontecendo, comecei a marcar: eram longas, duração de 50 a 60 segundo, com intervalos bem curtos, de cerca de 30 segundos entre uma e outra.E logo essas ondas começaram a se intensificar e como o o intervalo era curto tentei planejar o que eu precisava fazer quando estivesse entre elas. Queria escovar os dentes, trocar de calcinha e telefonar pro Fi. Fui até o quarto pegar uma calcinha, mas tive que voltar ao banheiro pois o piriri não passava. Foi nessa hora que olhei o relógio pela primeira vez, marcava 5h50 - por isso imagino que a bolsa tenha estourado por volta das 5h40, ou seja, o Fi mal tinha saído de casa! Se não me engano não consegui escovar os dentes, pois vi que a intesidade das contrações estava aumentando rápido demais e eu precisava avisar alguém.Cheguei ao escritório e liguei pro Fi. Tocou, tocou, tocou, mas ele não atendeu. Então liguei pra Ana Cris, isso devia ser umas 6h15 da manhã; na casa dela ninguém atendeu e no celular atendeu um cara que disse não conhecer nenhuma Ana Cris. Ai, meu Deus, o que está acontecendo, comecei a ficar com medo de não conseguir chamar ninguém! Liguei então pra Catia e avisei que a bolsa tinha estourado e que eu estava sozinha. A Tete dormia na minha cama e a dona Flavia no edícula da casa. Ela disse que tentaria ligar pro Fi, que ia avisar a Ana Cris pra ir logo e já ia se arrumar pra ir também.Desliguei o telefone e a Tete apareceu, toda linda descabelada com carinha de sono, me viu ajoelhada apoiando numa cadeira, com o telefone na mão e perguntou "Por que você tá aqui, mãe?"; "Acho que o João vai nascer, filha!"; e ela, muito alegre "Eba, posso ver a carinha dele?". Sorri e disse que demoraria um pouquinho, mas nem cogitei em tirá-la de perto de mim. Ela desde o início se mostrou muito tranquila, sem transparecer ficar impressionada demais com nada. Pedi que me ajudasse segurando o telefone pra ver se o papai atendia, mas nada dele atender. As contrações não paravam de aumentar de intensidade, eu já não aguentava ficar de pé e precisava realmente me entregar para a onda que se apoderava do meu corpo e deixá-la passar pra pensar no próxima providência a ser tomada.Liguei de novo pra Catia e ela me disse que a Ana Cris já estava a caminho. Percebi que não tinha jeito, eu precisava avisar minha sogra de algum jeito, pois ela teria que abrir a porta pra Ana Cris entrar. Como eu não consegueria descer as escadas, abri a janela e gritei pro quintal "Flááá!!". Graças a deus ela logo ouviu e abriu a porta do quartinho, mas nisso veio outra contração e eu abaixei rapidamente, desaparecendo da janela! Sorte que ela sacou que algo estava acontecendo e respondeu que já estava subindo. Quando ela chegou, pedi que me ajudasse a arrumar as coisas, tirar algumas coisas do caminho, pegar uns plásticos, etc. Bem que eu tinha imaginado que não daria tempo para arrumar direito o canto para o parto... Acabou sendo do jeito que estava, tudo meio bagunçado, sem grandes preparações... As contrações já estavam realmente intensas e continuavam muito próximas. Lembrei da posição de quatro como sendo boa para desacelerar o trabalho de parto muito rápido e me agachei no colchão que estava no chão. Pedi que trouxessem um pufe da sala para eu me apoiar. Nisso comecei a sentir a cabeça do bebê muito baixa, sentia que na contração ela estava descendo bem, conseguia perceber claramente a cabeça passando pelo canal de parto. Então, aflita porque ainda estava sozinha, além de respirar profundamente durante a contração eu dizia "Calma, João, calma, espera a Ana Cris chegar, João, calma....". Na contração seguinte, minha doulinha Teresa me orientou "Mãe, fala 'calma, João, calma'."Em algum momento ela me disse "Mãe, eu vou ficar aqui te 'potegendo', ta?" e eu é claro aceitei, naquela hora me parecia tão natural ela ali comigo, numa boa, sem dar trabalho nenhum. Logo a Ana Cris chegou, lembro que respirei aliviada e disse "ai, que bom que você chegou", mas nem cheguei a virar o rosto pra olhar pra ela. Concentrava toda minha energia em mim mesma, não desperdiçava nada, por fora eu estava bem zen enquanto deixava tudo acontecer intensamente por dentro. Tete cumprimentou-a e repetiu que estava sentada ali porque tava "potegendo a minha mãe". Ana Cris me fez um carinho nas costas, ajoelhou ao meu lado e pediu permissão para ouvir o bebê. Comentou que ele estava mesmo bem baixo. Perguntou se eu queria massagem e sacou o delicioso e cheiroso óleo de arnica com bétula da weleda, besuntando minha lombar com ele, o que foi absolutamente delicioso. Mas quando vinha a contração pedia que ela parasse a massagem e respirava longamente, rebolando de leve até a onda passar por mim. Mais alguns minutos e ouço a voz suave da Catia chegando. Novamente não cheguei a me virar pra falar com ela, só falei um "oi" discreto e me permiti continuar concentrada em minha viagem. Nem sei dizer o que exatamente ela fez nesses primeiros momentos depois que chegou. Lembro de ouvir a Tete falando com a Ana Cris, que certo momento tossiu e a Tete "Shhh, assim você vai assustar o meu irmão!".O ambiente era tranquilo e sem qualquer afobação. As poucas pessoas ali presentes estavam em sintonia de espera. A essa altura eu já tinha decidido não esperar mais que o Fi fosse avisado, sei que todos tentaram insistentemente chamá-lo ao telefone, mas por algum motivo misterioso seu celular estava no modo silencioso e ele não pôde ser avisado. Não me deixei abater por sua falta, apesar de ter planejado tanto um parto com sua participação. No entanto, naquele momento toda minha concentração estava em permitir que meu corpo trabalhasse, permitir que minha natureza agisse, desbloquear qualquer pensamento, qualquer controle racional. Como num exercício de treinamento do ator, me entreguei completamente ao que estava acontecendo, sem pensar o que era, para onde ia ou como seria, só deixei que a coisa acontecesse.Algum tempo depois que a Catia chegou e também me massageou as costas deliciosamente, as contrações começaram a espaçar mais. Sua duração era também mais curta, mas de uma intensidade indescritível. Sentia muita dor na lombar e nas costas inteiras, sentia minhas pernas enfraquecerem. Nos intervalos procurava relaxar o máximo que conseguisse apoiada no pufe à minha frente. Até que sem perceber comecei a instintivamente fazer força nas contrações, não mais respirava longamente, mas empurrava como se isso é que fosse ajudar ela passar.Estava nesse movimento havia algumas contrações, quando a Catia me perguntou se eu já estava com vontade de fazer força. Na hora não entendi, pois pra mim eu já estava fazendo, lembrei do parto da Tete, quando não consegui realizar a força certa, por conta da anestesia. Perguntei "Mas eu não tô fazendo?". E a Ana Cris disse que a Catia não estava vendo porque estava de costas, mas que eu tava fazendo sim. Depois a Catia me explicou que via a cabecinha do bebê descer na contração e voltar logo em seguida, e quis investigar se era a posição que não estava favorável ou se ainda não estava no momento real dos puxos.Como eu estava sim setindo os puxos, elas sugeriram que eu mudasse de posição e sentasse na banqueta de cócoras. Lembro de ter aberto os olhos nessa hora, como se estivesse voltando de uma viagem ou despertando de um sonho para onde voltaria logo em seguida. Tive preguiça só de pensar em ter que me mexer, mudar minha posição, mas me convenci de que seria melhor, mesmo porque naquela posição eu já não estava mais aguentando de dor nas pernas e a lombar queimava horrores.Elas me ajudaram a levantar, Ana Cris colocou a banqueta em cima do colchão encostada na parede. Tete perguntou "E eu, onde vou ficar?". Então Ana Cris ajeitou o pufe do meu lado e indicou pra Teresa sentar ali. Ela gostou e ali ficou pra esperar o irmão nascer.Assim que sentei na banqueta a contração veio muito mais poderosa e a vontade de fazer força muito mais intensa. Fiz força pra valer, e se não me engano logo na primeira já senti o famoso círculo de fogo, que parecia que estava esticando tudo, rasgando, ardendo, queimando. Assustei um pouco com a sensação, pois o pior é que acaba a contração e a ardência continua, pois a cabecinha do bebê fica ali parada, à espera da próxima onda. Falei alguma coisa pra Catia, que disse pra eu por a mão e sentir a cabecinha do bebê. Pus a mão sem imaginar o que sentiria, e realmente me surpreendi com uma coisinha mole e melecada, parecendo uma gelatina, impressionante!!! Lembrei da Carô pedindo que "tirassem a Rebeca dali" durante o expulsivo, e num momento repeti a frase, dizendo pra Catia "Aaah, tira ele daí, não to aguentando!". Ana Cris me orientou a assoprar durante a força, "fffff", o que a Teresa adorou.Em uma dessas poucas contrações na banqueta, aconteceu a cena mais emocionante do parto. Eu estava de olhos fechados, assoprando como mandou a Ana Cris, suportando o círculo de fogo queimando meu períneo. Senti então um carinho angelical no rosto, como se um anjo estivesse delicadamente me dizendo "É isso aí, está tudo certo, muito bem". Pela primeira e única vez durante todo o parto a Teresa decidiu tocar em mim, e com suas mãozinhas macias de criança acariciou meu rosto no momento mais oportuno que ela poderia ter escolhido. Abri os olhos e desejei agradecer, mas não conseguia forças ou palavras suficientes para expressar o quanto aquilo tinha sido reconfortante.Pedi então, com a voz meio sufocada pelo cansaço e intensidade da dor "Tete, faz mais um carinho?". Mas ela já estava em outra, olhava a Catia agachada na minha frente, a postos para pegar o bebê e respondeu "Mas, mãe, eu não tenho luva!".Foi aí, eu acho, que a Ana Cris deu pra ela segurar uma lanterna, dizendo pra ela ajudar o João a encontrar o caminho.
Imagino que na banqueta eu deva ter passado por umas quatro contrações, mais ou menos. Sei que não gostei da sensação do círculo de fogo e esqueci completamente do risco de laceração. Na contração seguinte fiz tanta força que o João saiu de uma vez só, cabeça ombro e corpo todo, sem se virar pra terminar de descer. Gritei "NASCEU!!! Ele nasceu, ele nasceu!!!". Quando ouvi o PLOFT e tudo se acabou, toda a dor se dissipou, uma emoção indescritível se apoderou de mim. Eu ria feliz, ria e ria, logo segurando meu bebê nos braços, com um louco desejo de protegê-lo, de abraçá-lo, de cuidar dele sempre sempre sempre. O corpo até então entregue a intensas atividades internas e viscerais de repente parou e se enrolou inteiro para proteger aquele serzinho indefeso, filhote bebê, molinho molhado e ainda preso a mim pelo cordão que passava no meio de minhas pernas. Não sei dizer se é amor o que senti nessa hora, é algo mais selvagem, mais primitivo, é algo possessivo até, um instinto louco de proteção e sobrevivência. Um bichinho tão pequeno, como poderia se afastar de mim, como poderia se expor ao mundo se não com minha proteção e meus cuidados?Consegui, consegui trazer meu filho ao mundo, ele está aqui em meus braços, todo melecadinho e escorregadio, mas das minhas mãos cuidadosas ele não escorrega de jeito nenhum! Nem me lembro do choro do João, lembro só de uns resmunguinhos e algum gemido.Depois de alguns minutos entregue ao sonho de ter finalmente meu bebê nos braços, Catia e Ana Cris pediram que eu deitasse pra terminar todo o processo. Com certeza a Catia já tinha percebido que havia lacerado, mas precisava ver direito o quanto. Começou então a parte mais chata do parto, pois depois que eu pensei que tudo estava finalmente gostoso, que a parte boa já estava começando, que nada, logo meu corpo começou a ficar dolorido novamente, minhas pernas doíam tanto que eu não conseguia sustentá-las dobradas. Colocaram o João no meu peito para estimular as contrações para a saída da placenta. Logo elas voltaram, realmente doloridas, mas dessa vez eu estava deitada, cansada e sem nenhuma vontade de me entregar a elas. Talvez por essa falta de vontade minha de ajudar meu corpo trabalhar, foi um pouco demorada e difícil a expulsão da placenta. A Catia teve que me pedir que fizesse força de novo, depois de algumas contrações doloridas e massagem feita por ela. Antes mesmo que tudo isso tivesse acabado, Ana Cris ligou o computador para avisar o Fi por email e também telefonou pra Mirella e pro André, que já estavam sabendo que o parto estava rolando. Foi ótimo recebê-los nessa hora, Tete finalmente aceitou sair de junto de mim e foi brincar com a Lalá e o Nathan, Mirella segurou o João enquanto terminava essa parte mais chatinha e ajudou a Ana Cris ver seu peso. João nasceu às 8h35 da manhã, cerca de 3 horas depois que a bolsa estourou. O Fi chegou pra pegá-lo nos braços às 9h40, quando a Catia estava envolvida em deixar tudo "em ordem" de novo, dando os pontos delicados na laceração que sofri. João pesou 4,07kg e media 55,5cm. Seu apgar foi 10/10, lembro bem da cor rosadinha dele. Nasceu numa 4ª feira de manhã, como sua irmã Teresa - eu sempre achei que 4ª feira é o meu dia de sorte... Interessante que eu sempre me imaginava passando o trabalho de parto durante a noite, no escuro, mas foi bem o contrário. Aliás, teve algum momento em que a Catia apagou a luz ou encostou a janela, não sei o que foi que me deu muito alívio.O parto não teve nada de especial, chique ou glamouroso. Não teve um lugar preparado, especialmente aconchegante, com música, luz, cheiros, nada disso. Tudo que envolveu esse parto foi o que está presente em nossa vida diária, nosso cantinho caseiro, nossos cheiros pessoais, nossos sons costumeiros. A baguncinha do entorno é bem própria da nossa casa, até a gata esteve presente, meio sem que ninguém lhe desse atenção, miando comprido enquanto eu gemia ou gritava. Até o vídeo que havíamos combinado com um amigo querido de fazer, quando chegou na hora não tive vontade de ligar, não desejei registrar, não sei explicar... Mesmo as fotos começaram a ser tiradas já do meio pro fim, de repente tive um momento de lucidez e falei pra Ana Cris pegar a máquina. Ainda bem! Hoje olho as coisas e os lugares e me recordo desse dia, às vezes sento na privada e meu olhar faz o mesmo caminho, marcando os segundos no relógio digital que fica na janelinha, pensando comigo mesma "Que legal, é hoje que meu bebê vai nascer!".Depois que a placenta finalmente saiu, novamente um alívio se espalhou e as sensações doloridas do corpo se dissiparam. Pedi pra tomar um café com leite e trouxeram também um pacote de Amanditas que o Fi tinha comprado especialmente pra esse dia. Menos de três horas depois que o João nasceu, por volta das 11h, levantei do colchão já limpa e costurada, peguei meu bebê nos braços e fui ligar pra minha mãe. Falei, com a voz mais natural do mundo "Oi, mãe, to com o João no colo!". Na hora ela não acreditou, mas passados alguns segundos conseguiu registrar a informação e não se aguentava de felicidade, de alívio por saber que tudo tinha dado certo, que os planos não falharam.Às vezes sinto que foi tudo tão rápido que nem deu pra "curtir" tanto, rs... Mas sei que foi tudo perfeito como tinha que ser, essa foi nossa história, esse foi o parto que eu e meu filho João conseguimos realizar, com a indispensável assistência da minha princesa Teresa, da sereníssima Catia e da poderosa Ana Cris.

Só tenho a agradecer, a tantas pessoas....Ao meu fiel companheiro, amado marido, que não esteve presente no parto, mas me apoiou o tempo todo, dando todo suporte e segurança possíveis, acreditando em mim sempre. Ainda vamos precisar providenciar um terceiro para conseguirmos realizar nossa vivência de parto juntos, né!;

À minha filha linda deliciosa, que não poderia ter sido mais especial, compensando a falta do pai no parto;

À doce, serena e segura Catia, que desenvolve seu trabalho com maestria e delicadeza, estando sempre disponível às minhas "amolações da madrugada";

À encantadora Ana Cris, por todo seu empenho e realização em torno da causa da humanização do parto;

À minha sogra Flavia, por confiar em nossas decisões e nos oferecer o suporte que precisamos, sempre;Aos meu pais e irmãs, por respeitarem nossas escolhas, por me amarem, me apoiarem, por existirem como são!;

À minha amiga Mirella, que me levou a tudo isso, por tantas conversas francas e deliciosas;Às tantas maternas amigas virtuais e reais, com quem dividi dúvidas, anseios, inquietações;Acima de tudo ao meu filho João, por ter nos escolhido como seus pais;

Aos anjos, espíritos de luz, ao senhor nosso pai, por ter-nos confiado Teresa e João; de minha parte posso dizer que amor aqui não falta, e a busca é incansável pelos melhores caminhos, com paciência, dedicação e respeito às imperfeições.













sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Vídeos do programa Super Pop, sobre Parto Natural

Com a participação da Doula e enfermeira obstetra Ana Cris, que na época do programa ainda não estava formada, ela é uma batalhadora na divulgação do Parto Natural.















quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Nascimento com consciência

Uma mulher espera,
uma família se forma com alegria.
Consciente das possibilidades.
Confiando na capacidade natural do nosso organismo.
Com esforço, esperando em harmonia, sem pressa, com tranqüilidade,
com alegria, transmitindo força e otimismo.
Recebendo massagem e apoio, controlando a dor de forma natural.
Consciente de que o parto é algo fisiológico, não uma enfermidade.
Consciente do papel protagonista da mãe.
Consciente da possibilidade de eleger quem te acompanha, com respeito, tranqüilidade e carinho.
Consciente de qual é sua melhor posição, para que o bebê saia suavemente.
Do momento maravilhoso que esta vivendo.
Consciente de que este momento semeia uma semente, para toda a vida.
Uma semente de amor.
Consciente de que o melhor lugar para seu bebê é junto de você
sobre teu peito, conectado a você pelo cordão, nada deve separá-los.
Consciente de que o leite lhe brinda com nutrição, segurança, carinho e defesas imunológicas.
Consciente de que a sensação de segurança dos primeiros momentos de vida, o acompanharão por toda a vida.
Consciente que seu primeiro olhar, marcara sua forma de ver o mundo.
Consciente de que os laços que se formam no nascimento , perduram para sempre, formando um vinculo estreito.
Consciente que mudando a forma de nascer, muda-se a forma de viver.

fonte: http://www.youtube.com/watch?v=RHGmPmeGDb0





Parto Leboyer

Além de nos preocuparmos com o parto, temos que pensar como vamos receber o bebê no momento do nascimento, já foi provado que o parto é um momento traumático para o bebê, e que dependendo da experiência do nascimento, gerará seqüelas emocionais para o resto da vida, é por isso que defendo tanto, não só o parto normal, mais também humanizado.
Quem se interessar pelo assunto pode pesquisar sobre o parto leboyer, já tão antigo e ainda não tão conhecido, nem praticado pela medicina brasileira.

Tem um vídeo muito antigo que passou no fantástico em 1979, explicando a importância do parto humanizado, já fazem 30 anos, mas mesmo assim é suuuper atual.

Quero muito que nossa sociedade mude o ponto de vista com relação ao nascimento, e nós gestantes temos que lutar pelo melhor para nossos filhos. Acredito que isso começa pelo jeito que escolhemos para eles nascerem.

O Desejo de Perfeição nasce com o trauma do nascimento

Este texto, de Osho, um filósofo iluminado, representa exatamente o que é ser um livre pensador, um espírito rebelde e independente, que desafiava os dogmas religiosos, sociais e políticos, e insistia em buscar a verdade por si mesmo, ao invés de adquirir conhecimentos e crenças impingidos por outros.
No texto, ele fala da dificuldade que temos em nos desvencilhar do trauma do nascimento, e o quanto isso nos torna perfeccionistas e neuróticos.


O que é o desejo de perfeição?
Adheera, o desejo de perfeição é a busca do útero perdido, do paraíso perdido. A criança é totalmente feliz no útero da sua mãe; essa memória persiste. Ela não é apenas uma memória no cérebro; ela está em cada célula do corpo, em cada fibra do corpo. Ela envolve todo o seu ser.
Essa memória persiste. Aqueles nove meses foram de gozo eterno, de relaxamento e entrega tamanhos, que não é fácil esquecer. Embora conscientemente você tenha se esquecido – devido ao trauma do nascimento, sua consciência se desconectou – seu inconsciente ainda anseia pelo útero; ele tenta, de todas as formas, voltar ao paraíso perdido.

A religião consiste nessa busca, e a ciência igualmente consiste nessa busca. O esforço científico tenta criar o mesmo útero no exterior – aquecimento central, ar condicionado, boas roupas, melhor tecnologia. Você se empenha em criar o útero exterior. E a religião tenta criar o útero interior – com a prece, técnicas de meditação, com o amor, com Deus. Mas seu empenho é o mesmo, voltar àqueles lindos dias. Esse útero perdido é a fonte da parábola de Adão e Eva no Jardim do Éden.

Você pergunta: O que é o desejo de perfeição?

O desejo de perfeição consiste nisto: seja qual for a sua situação, ela nunca satisfaz. Nunca é como deveria ser, há sempre um senão. Você ainda fica imaginando um estado melhor das coisas, melhores dias, melhores possibilidades. E fica ansiando por elas.
Você só pode abandonar a busca da perfeição se voltar ao passado e passar novamente pelo trauma do nascimento. Se você o reviver conscientemente, se recordar conscientemente aqueles dias no útero, o desejo de perfeição desaparecerá instantaneamente. O desaparecimento desse desejo é um grande alívio, porque só então você poderá começar a viver cada momento. Como você consegue viver com esse desejo de perfeição? Ele é a fonte de todas as neuroses.
O homem que deseja ser perfeito, inevitavelmente torna-se um neurótico, porque não consegue estar aqui. Ele vive no futuro, que não existe. Não pode desfrutar o presente momento, só condená-lo. Não pode amar esta mulher, porque tem uma idéia da mulher perfeita. Não pode amar este homem, porque ele não é perfeito. Não pode saborear este alimento, esta refeição, esta manhã, nada mais o satisfaz, não pode satisfazer. Sua expectativa está sempre presente: ele está sempre comparando e sempre se decepcionando.
O homem que vive com desejo de perfeição, tem a vida condenada. E a sociedade colabora com isso. Os pais, as escolas, os colégios, as universidades, os mahatmas , os sacerdotes, os políticos, todos colaboram para neurotizá-lo.
Desde a infância, você não é aceito como você é. Disseram-lhe: “Seja desta maneira, só assim você será aceito”. Se quiser viver a vida do seu jeito, você será condenado por todos, todos ficarão contra você. Seus pais não poderão suportá-lo. Precisam moldar, formar, mudar, manipular. Eles precisam fabricar você de acordo com os desejos deles.
E qual é o problema dos seus pais? Eles também estão sofrendo o trauma do nascimento. Tentaram, por toda a vida, ser perfeitos e falharam. Ninguém jamais pode ter êxito nisso; esse desejo é de tal natureza, que está fadado ao insucesso. O fracasso é inevitável, porque você pode estar vencendo, mas a idéia da perfeição começa a se sofisticar cada vez mais. Na medida em que se vai vencendo, a idéia começa a se distanciar mais para o futuro. Ela fica mais sofisticada, há mais expectativas...
A distância entre você e a idéia da perfeição permanece a mesma. Se você tem dez mil rúpias, precisará de cem mil para ser feliz. Quando tiver cem mil, seu desejo já caminhado para a frente; agora isto já não basta. Acontece em todas as áreas da vida.
Os pais vivem os seus próprios traumas. Por toda a vida tentaram e fracassaram; agora desejam viver através do filho. Com isso, começam a fazer dele um ser neurótico, começam a ensinar ao filho. Esta é uma forma alternativa de viver. Eles fracassaram; agora sabem que a morte se aproxima, que seus dias estão contados; eles estão perdendo a esperança. Mas então surge uma nova esperança: poder viver através do filho. Já que eles não foram perfeitos, ao menos os filhos poderão sê-lo. Dizem que uma árvore se conhece pelos seus frutos. Se os filhos forem perfeitos, os pais devem ter sido perfeitos.
É assim que a neurose se perpetua, de geração em geração. Os pais estão constantemente tentando, de todas as formas, aperfeiçoar a criança. Só o que conseguem com essa atitude é fazer com que ela se sinta condenada como ela é. Eles tornam impossível que ela ame a si mesma, respeite a si mesma. E quando perde o amor e o respeito por si, uma pessoa está perdida.
O mundo sofre tanta loucura, todo tipo de problemas mentais, de doenças físicas. Noventa e nove por cento das causas de todos esses problemas do corpo e da mente vêm da mentalidade que a criança tem de ser perfeita.

Uma família foi a um restaurante. Depois de anotar o pedido dos adultos, a garçonete virou-se para o garotinho.
“O que você vai querer, filhinho?”
“Eu quero um cachorro-quente”, respondeu o garoto, timidamente.
Antes que a garçonete pudesse anotar o pedido, a mãe interrompeu: “Não, nada de cachorro-quente. Traga batatas, um bife e cenouras”.
A garçonete ignorou-a totalmente.
“Você prefere ketchup ou mostarda em seu cachorro-quente?” perguntou ao garoto.
“Ketchup”, respondeu ele, com um sorriso de felicidade.
“Já vai sair”, disse a garçonete, indo para a cozinha.
Foi um espanto geral.
Finalmente, o garoto perguntou aos pais. “Vocês viram? Ela acha que eu sou real!”

É aí que nasce o problema: vocês não permitem que seus filhos sejam reais. Fazem com que eles se sintam irreais, vocês os forçam a se sentir falsos, rejeitados, inúteis. E quando essa idéia é criada na mente de vocês, que eles são inúteis do jeito que são, é natural que surja neles um grande desejo de ser perfeitos, e com isto todo o tipo de neurose.

Meu empenho aqui é em ajudar você, não a ser perfeito, mas a abandonar toda essa besteira. Abandonando-a, pela primeira vez você será real.
A realidade nunca é perfeita, lembre-se. Se a realidade está sempre crescendo, como ela pode ser perfeita? Se alguma coisa é perfeita, o crescimento é impossível. Só a imperfeição pode sentir a alegria do crescimento.
Você deseja permanecer como uma flor, crescendo, abrindo-se? Ou deseja tornar-se apenas uma pedra morta, perfeita, sem abertura, sem crescimento, sem mudança? Seja imperfeito respeite suas imperfeições, e você poderá alegrar-se e celebrar, poderá ser saudável e inteiro. E não precisará procurar um psiquiatra ou um psicanalista para ficar por anos deitado num divã, falando besteiras. E também não haverá necessidade de qualquer tratamento de choque. Na verdade, se o seu estresse mental desaparecer, o seu corpo se sentirá imediatamente relaxado.
Muitas doenças desapareceriam automaticamente da face da Terra, se essa idéia idiota de tornar-se perfeito desaparecesse. Mas ela tem sido ensinada de toda parte, nas igrejas, nos templos, nas mesquitas, nas universidades. Em todo lugar, todos parecem estar envolvidos nessa conspiração. Parecem absolutamente determinados a tornar todas as pessoas perfeitas. Ora, jamais existiu um único ser humano perfeito, e não pode existir. A imperfeição é o modo de ser das coisas. A imperfeição é bela, porque tem potencial para crescer e fluir. A perfeição é simplesmente a morte, nada mais. A vida é imperfeita. E a vida gosta da imperfeição.
Eu lhes ensino a totalidade e não a perfeição: são dois objetivos diferentes. A perfeição é um objetivo neurótico, a totalidade é um objetivo saudável. A perfeição está no futuro, a totalidade está aqui e agora. Você pode ser total neste momento. Pode ser total em sua raiva, pode ser total em seu sexo, pode ser total em tudo o que esteja fazendo, limpando o chão, cozinhando, escrevendo poesia. Você pode ser total! neste momento! Isso não exige preparação, não exige treinamento.
Sendo total, você entrará em Deus, entrará no nirvana. Quando se é total, o eu desaparece – esta é a beleza da totalidade. Tente entender, é sutil, é imensamente importante: quando se é total, o eu desaparece.

Você já experimentou um momento total? Então sabe que o eu desaparece imediatamente. Se você está totalmente apaixonado por uma mulher ou por um homem, o eu desaparece. Quando está fazendo amor, se é total, o eu desaparece. Se você sai de manhã para um passeio e é total nisso, nada mais importa, nesses lindos momentos, apenas a manhã e você, você e a manhã, os pássaros, as árvores e o sol. Você está totalmente imerso, profundamente imerso no momento – o eu desaparece.
O desaparecimento do eu é uma bênção. Você saberá o que Buda quer dizer com o “não-eu”, a total bem-aventurança. Ele jamais usa as palavras: “total bem-aventurança”, porque conhece você – você poderia fazer dela um objetivo, e começar a lutar por alcançá-la. Poderia fazer dela o objetivo de um perfeccionista e dizer: “Não descansarei até que me torne totalmente bem-aventurado”. Nesse caso. você não entendeu.

Se você é total, a bem-aventurança acontece por acréscimo, porque o eu desaparece. Dançando, cantando, ouvindo música, ou apenas estando aqui comigo, às vezes acontece. Eu posso vê-la acontecendo com muitas pessoas. Quando olho para o seu rosto, sei se há um eu ou não; o rosto assume imediatamente uma outra qualidade. Quando olho para você e não existe o eu, você é apenas uma abertura, uma janela, e eu posso ver claramente Deus em você. Nesses momentos, Deus está presente, você não está. Todas as nuvens desapareceram, o céu ficou claro e transparente, o sol está brilhando.
Sempre que o seu eu desaparece por um momento, de repente posso ver a luminosidade que vem em seu rosto, a qualidade de magia que nasce ao seu redor. Mas fomos ensinados a viver de um modo não-total através da idéia de perfeição.

Eu lhes ensino a totalidade. Na totalidade, o eu desaparece; com a perfeição, acontece justamente o contrário. Com a idéia de perfeição, o eu é reforçado. É um ideal egoísta: “Eu quero ser perfeito”. O eu não pode ser total, porque nenhum eu pode ser encontrado na totalidade. Por isso, o ego tem interesse em tornar-se perfeito, ser o homem mais perfeito ou a mulher mais perfeita no mundo. O ego se sente muito bem, começa a lutar nesse sentido. O ego está envolvido com a idéia de perfeição.
Com a experiência da totalidade, o ego simplesmente não existe. Se você aprender como estar aqui e agora, pouco a pouco verá que a vida é linda do jeito que é. A vida é linda em ser-assim, em sua qualidade de ser como Não necessita de nenhum aperfeiçoamento.

Isto pode ser facilitado por intermédio do trauma do nascimento. Se você passar pelo trauma do nascimento, se o reviver conscientemente, o próprio significado do nascimento mudará.
Neste exato momento, a experiência uterina permanece no seu inconsciente, ela é tão importante que você está inconscientemente lutando por ela. É por isto que as pessoas continuam pensando que no passado tudo era bom. É apenas uma projeção, por causa da experiência do útero. Em todas as sociedades do mundo, em todas as religiões do mundo, persiste a idéia de que, em algum lugar no passado, existiu uma idade de ouro. Quando Adão viveu no Jardim do Éden, era o paraíso. Na Índia, dizem que a idade de ouro aconteceu muito antes da história. Depois dela, as coisas começaram a decair – o pecado original. Vivíamos uma situação de felicidade total, e então começamos a decair e a perdemos.
É a mesma história com roupagem filosófica. A queda original nada mais é do que a queda do útero. A lembrança de que antes, algum tempo antes, muito longe no passado, tudo era dourado e lindo, não passa de uma lembrança projetada na história, uma lembrança individual projetada na história coletiva. E nós precisamos retomá-la, por isso ficamos interessados no futuro. O passado é importante, o futuro é importante, só o presente não é importante – porque perdemos o passado, e só no futuro, graças às nossas tentativas e aos nossos esforços, um dia o alcançaremos.
Então, há dois tipos de pessoas, que basicamente não diferem. As pessoas religiosas dizem que a idade de ouro aconteceu no passado. As não religiosas dizem que vai acontecer no futuro, que a utopia está chegando. Os hindus dizem que a idade de ouro – satyayuga, a era da verdade – aconteceu no passado. E os comunistas dizem que a idade de ouro - samyuga, a idade da igualdade – vai chegar no futuro.
Eles não são diferentes. Parecem diferentes, porque um fala do passado, e o outro fala do futuro. Mas o mecanismo é o mesmo: ambos querem evitar o presente. Comunistas e anticomunistas não são muito diferentes.
A espiritualidade autêntica começa no presente e termina no presente. Não tem passado e não tem futuro. Este momento é tudo.

Assim, Adheera, procure entrar conscientemente em seu inconsciente. Tente penetrar onde nasce esse desejo de perfeição. Vá para a sua infância . Você foi ensinado, condicionado, camada por camada; terá de descascar a cebola de sua mente. E então, finalmente, chegará ao trauma do seu nascimento, ao dia em que nasceu.
Você pode revivê-lo. Esse é o processo do renascimento: você pode revivê-lo. E assim que o reviver, ele desaparecerá. O que acontecerá? Uma total mudança de perspectiva.. Se puder revivê-lo conscientemente, se puder regredir, tornar-se uma criança, uma criança pequena, um bebê que acaba de sair do útero, você irá passar por muito sofrimento e agonia. Sofrerá a mesma dor do nascimento; se sentirá sufocado, sua respiração ficará ofegante. Algumas vezes, a respiração poderá cessar totalmente; o corpo ficará paralisado. Você poderá sentir que está morrendo, porque foi o que você sentiu quando estava saindo do útero. Sentirá que está passando por um túnel muito estreito, sufocante, escuro. Um grande medo surgirá em seu ser, você será sacudido e agitado pelo medo. Vai precisar de alguém para ajudá-lo.
Daí a necessidade de um Mestre. Você precisará de alguém para protegê-lo, precisará de alguém para lhe dar suporte e dizer-lhe: “Não tenha medo, vá em frente. Deixe que passe, não fuja disso”. Assim que tiver atravessado e vivenciado conscientemente o que aconteceu inconscientemente em seu nascimento, tudo se apagará. Este é o processo da mente. Tudo o que é vivido conscientemente é apagado, não tem mais poder sobre o seu ser inconsciente.
E então, pela primeira vez, você abre os seus olhos e vê que o mundo é lindo. O salgueiro é verde e a rosa é vermelha. E então, pela primeira vez, entende que o útero era bom, mas não é a meta. O útero era conveniente, mas era somente uma preparação. Não era a vida real; mas a vida de um dependente, pura exploração. Era dependência. O útero não conhecia a liberdade – como pode ser lindo? Sim, ele era conveniente e confortável, mas você simplesmente vegetava, não estava realmente vivendo. Era um porco satisfeito. O útero não tem valor por si mesmo.
E assim você começa a ver que a vida tem belezas que nenhum útero jamais poderá lhe proporcionar.
Todo útero é confinado. É por isso que, após nove meses, a criança precisa sair dele, por causa do confinamento. O útero é uma prisão; é confortável e quente, mas uma prisão é sempre uma prisão. Mesmo que seja confortável, mesmo que seja quente, nada disso a transforma em outra coisa. É uma prisão.

Você está saindo do útero para a liberdade. Todo o céu se abre, o sol, a lua, as árvores, as estrelas – eles não existiam para você. E o canto dos pássaros, a música, toda a poesia e o amor – eles também não existiam para você. Seu paraíso pouco tinha de paraíso; seu paraíso era um paraíso muito bobo.
Assim que você percebeu que ele não tinha valor... Ele foi necessário naquele momento, porque você estava crescendo; era muito frágil e delicado, precisava de proteção. Quando a criança completa nove meses, ela anseia por sair, quer sair, quer se livrar do útero. Ela está pronta para entrar no mundo, e conhecer as alegrias e as misérias do mundo. Está pronta para mergulhar fundo nas experiências da existência.
Quando você tiver vivido conscientemente o trauma do nascimento e apagado a memória da dor, ficará espantado ao notar que uma espécie de névoa se afastou dos seus olhos. E quando os reabrir os, as árvores serão mais verdes do que jamais foram e tudo será totalmente diferente. Você verá o mundo em cores psicodélicas, sem precisar de drogas.
As pessoas utilizam drogas para criar uma coisa que é muito natural. Para isso, não é preciso destruir quimicamente o corpo. Basta passar pelo trauma do nascimento e retornar que o mundo inteiro e toda a experiência do mundo se tornarão psicodélicos. Tudo fica mais colorido. É uma permanente celebração. Esta celebração não terá fim – ela dura do princípio sem princípio ao fim sem fim. É uma canção eterna.
Quando você começa a enxergar isto, a vida começa. É o que Jesus quer dizer com estas palavras: “A não ser que você nasça de novo, não entrará no reino de Deus”. Ele está falando do renascimento!
No Oriente, temos um nome para o homem que se tornou alerta e total, nós o chamamos dwija – nascido duas vezes. Ele atingiu o segundo nascimento.
O primeiro nascimento está fadado a ser inconsciente. Se você ficar apenas no primeiro nascimento, continuará sendo um perfeccionista. É só nascendo uma segunda vez, conscientemente, e tendo apagado a dolorosa memória do primeiro nascimento, que você viverá a totalidade. Não com o desejo de perfeição – o desejo de perfeição desaparece quando você reconhece que este é o mundo mais perfeito, que você é a pessoa mais perfeita, que cada pessoa é perfeita, e que tudo é como deve ser.
Quando você percebe que tudo é como deve ser, surge uma grande gratidão. A prece é natural. Você se curva diante da terra, curva-se diante do sol, curva-se diante da existência. Esta é a qualidade religiosa; ela não consiste em ir à igreja e pensar que é religioso, em se curvar diante de Cristo e pensar que é religioso: você não é! Não é nada disto. Você está simplesmente com medo; está pensando que Cristo irá salvá-lo.
Ninguém pode salvá-lo, a não ser que você mesmo se salve. Nem Cristo, nem Buda podem salvá-lo. Mas você pode salvar a si mesmo. Salvar-se é sua responsabilidade. E o caminho para salvar-se é renascer, é nascer de novo.
Lembre-se: se você sofre com o desejo da perfeição – e quase todos sofrem – considere como ponto de grande importãncia a necessidade de retornar ao processo de seu nascimento, e apagar toda aquela fita. E então volte a olhar com os olhos vazios, e ficará surpreso.
Já trabalhei com muitas pessoas. Sempre que elas se defrontam com a memória de seu nascimento, acontecem coisas estranhas, incríveis. Eu estava ajudando um jovem a fazer a travessia. Ele chegou a um ponto em que começou a se sentir sufocado; chorava e soluçava, e então ficou paralisado. Por um momento, tudo cessou, até mesmo a respiração. Foi uma grande agonia. Então ele abriu os olhos, olhou para mim e disse: “É estranho. Estou sentindo um cheiro de clorofórmio, um cheiro de hospital”. Eu lhe perguntei: “Você nasceu num hospital?” Ele respondeu: “Não sei, nunca perguntei a minha mãe”. Nós averiguamos com a mãe e ela confirmou: “Sim, ele nasceu num hospital. Eu estava com tanta dor que me deram uma forte dose de clorofórmio”.
A memória do clorofórmio entrou em suas células. Ele ainda podia sentir o cheiro, vinte e oito anos depois!
Mas assim que você passar por essas memórias, elas começarão a perder o controle sobre você. Passar pelo nascimento é o primeiro passo. Se você puder fazê-lo, o segundo passo será passar pela morte que precedeu seu nascimento, nove meses antes. Se você puder atravessar seu nascimento, você poderá facilmente atravessar sua morte. E quando tiver atravessado sua morte, sua vida passada estará acessível a você. E então ela e toda a sua estupidez...

É por isto que estes ditos do Buda e estes sutras de Ikkyu lhe parecem tão depressivos, é que eles se baseiam numa compreensão da vida totalmente diferente. Essas pessoas conheceram suas vidas passadas, e perceberam a tolice dela. Você não pode perceber. Acredita estar fazendo grandes coisas; não está consciente.
Se você esteve apaixonado por muitas e muitas vidas, muitas e muitas vezes, e sempre fracassou, e se você vier a saber disto, se puder ver isto, então o caso de amor que você vive hoje simplesmente se torna inválido, precisamente em razão dessa experiência. Você ficou sabendo que esses são os caminhos em que você esteve constantemente se enganando. É uma repetição, uma roda que continua girando.
Estes sutras não são filosóficos, não propõem qualquer doutrina. Eles se baseiam numa experiência de vida totalmente diferente, numa visão diferente. Em razão disso, você algumas vezes ficará perturbado.
Há alguns dias, Arup estava dizendo a alguém: “Que discursos pesados, e Osho chamou esta série de Take it Easy” (Vá com Calma).
Foi por isto mesmo que chamei esta série de Take it Easy (Vá com Calma). Não é fácil; é difícil, é muito difícil entender isso. É quase impossível entender, porque romperá todo o seu estilo de vida. Não é fácil, e foi por isto que chamei esta série de Take it Easy (Vá com Calma).

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